Você não tem que escolher entre a economia e a vida da sua avó.

Quando a nova pandemia bateu à porta da Itália, o prefeito de Milão fez pouco caso e disse que não adotaria uma política de isolamento pois fazê-lo seria maléfico para a economia. Hoje, depois de Bérgamo, Milão é a cidade mais castigada pelo coronavírus no país.

Contra fatos não há argumentos: enquanto não há vacina, a única maneira de desacelerar o contágio do COVID-19 a ponto de não sobrecarregar nosso aparato de saúde é adotar a quarentena o quanto antes possível. Quem diz o contrário é burro ou desonesto.
Bolsonaro, desde o começo tem diminuído o caráter da pandemia: em pronunciamentos vergonhosos  chamou de "gripezinha" e se disse imune a ela, graças ao seu "histórico de atleta". Isso enquanto médicos e estadistas do mundo inteiro alertam para seu perigo e recomendam o confinamento. Alguns governadores, antes bolsonaristas até, como Carlos Moisés (SC), Ronaldo Caiado (GO), João Dória (SP), Wilson Witzel (RJ) e etc. tiveram sensatez o suficiente para compreender a gravidade do problema e souberam observar os exemplos de outros países. Fizeram aquilo que era mais sensato: decretaram a quarentena para achatar a curva e suspenderam as viagens interestaduais para não importar mais casos. Decisão que Bolsonaro anulou na canetada. A maioria dos governantes das grandes potências fizeram o mesmo: Angela Merkel, premiê da Alemanha disse em pronunciamento que o coronavírus era "o maior desafio que o país enfrentaria desde a reunificação, quem sabe, desde a reconstrução após a 2ª guerra". Boris Johnson, premiê do Reino Unido, voltou atrás em uma decisão própria e decretou a suspensão de todo o robusto sistema de educação pública do país, além de abrir o recrutamento para voluntários ao NHS. Justin Trudeau do Canadá e Emanuel Macron da França também arregaçaram as mangas, com o segundo turno das eleições municipais na França sendo adiadas.
Porém, aqui no Brasil, as coisas não iam nesse ritmo: os governadores em guerra contra o Governo Federal. A pressão interna e externa começava a incomodar Bolsonaro, então, no melhor estilo Steve Bannon, o publicitário de Trump, começou uma campanha de radicalização e intoxicação do debate. Colocou como se tivéssemos que escolher entre o crescimento econômico (que Paulo Guedes não conseguiu devolver ao Brasil mesmo sem o vírus) e conservar a vida das possíveis vítimas da pandemia no país. Essa simplificação idiota da situação é completamente irreal: vários parlamentos de diversos países (inclusive o do Brasil,  mais recentemente, apesar de Bolsonaro ainda não tê-la sancionado) aprovaram rendas mínimas para a população com o intuito de amortecer os efeitos econômicos do vírus sem cometer o suicídio coletivo de suspender a quarentena.
Outro erro vem sendo cometido. Por conta da desindustrialização e dos seguidos cortes do orçamento público para o financiamento da pesquisa científica, violência contra o país que está sendo cometida desde o governo Dilma, o Brasil atualmente não tem condições de produzir os testes de COVID-19 necessários para a população nem nos sonhos mais otimistas. Os centros de testagem, para onde os testes estão sendo enviados para serem avaliados, são distantes do interior e estão sobrecarregados. Os poucos testes que temos são importados, ou seja, caríssimos. Não há como saber por quanto tempo teremos esse escasso fornecimento, a concorrência internacional pelos excedentes da China e implacável. Esse problema, gera situações como: U.T.I.s lotadas com pessoas em que o teste seria uma mera formalidade, já apresentam todos os sintomas do coronavírus, mas não contam como casos confirmados, já que não receberam o teste oficial. "Tem rabo de pato, bico de pato, nada que nem pato, mas não pode ser classificado como pato". Enquanto isso, o país mais bem-sucedido no combate à virose, Coréia do Sul, tem apostado em testar o máximo possível de pessoas, identificando infectados ainda no período de incubação, isolando-os e tratando-os antes mesmo que apresentem sintomas e possam infectar outras pessoas.
Outra doença já foi cataclísmica na história nacional: a Gripe Espanhola de 1918. Vinda de uma variante do Influenza A H1N1, muito provavelmente, essa gripe pulou de animais para humanos no Kansas, interior dos EUA e foi levado para a Europa por um recruta do Exército Americano indo lutar a Primeira Guerra Mundial. Nas trincheiras da França, onde a falta de higiene era quase tão letal quanto a artilharia, o vírus se espalhou rapidamente. No mesmo ano a guerra terminaria e os soldados voltariam para a casa, onde espalhariam o vírus. Um navio britânico, o SS Demerara, que aportou em Recife, Salvador e na Capital Rido de Janeiro, trouxe o vírus para o país. O governo quis manter a negação e foi hesitante em fechar bares, restaurantes e o comércio. Já era tarde demais, o recém-eleito Presidente para seu segundo mandato não-consecutivo, Rodrigues Alves, contraiu a doença e morreu antes de tomar posse.
Uma coisa é fato: o coronavírus deixou à mostra várias mazelas do Brasil. A incompetência incrível do Presidente da quinta maior nação da Terra, a indiferença quase sociopática do discurso neoliberal para com os mais pobres - que serão os mais castigados -, e como a conta da desindustrialização e do sub-financiamento da ciência chega. Com juros e correção monetária.

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